
Produções que nascem do choque entre ficção e realidade costumam aguçar a curiosidade do público, especialmente quando envolvem dilemas morais e reviravoltas familiares.
Mesmo assim, nem todo enredo inspirado em memórias pessoais mantém a fidelidade dos fatos: roteiristas repaginam lembranças, incrementam tensão e criam novos personagens para fisgar o espectador.
É nesse território nebuloso que surge O Píer, drama criminal da Netflix criado por Kevin Williamson, cuja estreia reacendeu a discussão: a história aconteceu de verdade?
A série ambienta‑se na fictícia Havenport, Carolina do Norte, onde os Buckley comandam um império pesqueiro afundado em dívidas e, na tentativa de salvar o legado, enveredam pelo tráfico de drogas.
Ecos de uma história familiar
Apesar de o enredo ser fruto de criação, suas raízes estão ancoradas na juventude de Williamson, marcada por episódios que mesclavam pesca tradicional, crise econômica e caminhos ilícitos.
Crescido em New Bern, também na Carolina do Norte, ele lembra que a família dependia dos frutos do mar para sobreviver, até que o colapso do setor na década de 80 deixou muitos pescadores sem renda.
Foi nesse cenário adverso que seu pai aceitou transportar drogas de barco, vendo ali uma rota rápida para colocar comida na mesa e viabilizar o sonho universitário dos filhos.
O trabalho clandestino rendeu dinheiro, mas trouxe consequências. O roteirista acabou preso, experiência que moldou sua percepção sobre como pessoas comuns cruzam linhas perigosas sob pressão financeira.
Para a televisão, Williamson transformou esses fatos em metáfora: Harlan Buckley compartilha o instinto protetor do pai do autor, enquanto o tráfico surge como atalho tentador que cobra um preço alto.
O Píer está disponível na Netflix.