
Existe algo inquietante quando uma produção se baseia em fatos reais e, ainda assim, soa absurda demais para ser verdade. Em Nome do Céu, nova produção do Disney+ é assim, e reconstrói um crime tão surral que parece ficção.
A minissérie conta com um enredo carregado de tensão, reconstruindo um crime que abalou o estado de Utah nos anos 1980. No centro da trama está o detetive Jeb Pyre (Andrew Garfield), cuja investigação coloca sua própria fé à prova.
O caso gira em torno dos assassinatos de Brenda Lafferty e sua filha recém-nascida. O principal suspeito é um membro da própria família, motivado por interpretações extremistas da doutrina Mórmon.
Enquanto tenta entender o que levou os responsáveis a cometer tamanha atrocidade, o detetive precisa confrontar os dogmas que sempre aceitou sem questionar.
Quando a investigação vira confronto pessoal
Jeb Pyre, além de ser um investigador buscando por respostas, também enfrenta o colapso de tudo em que acreditava. Ao descobrir as práticas radicais escondidas sob a superfície da religião que o formou, se vê obrigado a questionar a própria identidade.
A série, no entanto, não tenta esconder quem são os culpados. Desde o início, fica claro que os responsáveis não estão longe. A força da história está em como tudo chegou a esse ponto, e quais ideias serviram de combustível para o crime.
Evitando o ritmo acelerado dos thrillers tradicionais, seu foco está nas motivações e nos conflitos internos dos personagens. Algumas passagens são mais lentas, mas servem para aprofundar a relação entre fé e poder, deixando o suspense em segundo plano.
Andrew Garfield entrega uma atuação contida, dando voz a esse conflito silencioso. Sem grandes discursos, o personagem transparece o desconforto de quem se encontra diante de algo que não consegue mais justificar.
Nos flashbacks, a personagem de Brenda, vivida por Daisy Edgar-Jones, ganha destaque. Ela representa a resistência dentro de um sistema opressor, com posicionamentos firmes e coragem diante do conservadorismo crescente à sua volta.
Uma produção incômoda e relevante
Com sete episódios, sua proposta é escancarar o desconforto e provocar reflexão. A direção aposta na tensão contida, nos silêncios e nos dilemas morais.
A trama mostra como certas convicções, se levadas ao limite, podem justificar atos irreversíveis, e o contraste entre quem questiona a própria crença e quem mergulha no extremismo é constante durante a trama.
Em Nome do Céu se distancia dos clichês do true crime para oferecer algo mais profundo. Em vez de pistas e reviravoltas, entrega um mergulho nas brechas entre fé e justiça, ideal para quem busca uma experiência reflexiva.