
A nova temporada de Monstro, antologia criada por Ryan Murphy, mistura fatos históricos com ficção, deixando de fora alguns dos aspectos mais sombrios e curiosos dos casos retratados. Em Monstro: A História de Ed Gein, temporada que inspirou o terror americano, não é diferente.
Durante a década de 1950, Ed Gein chocou os Estados Unidos com crimes que ultrapassaram qualquer noção de sanidade. O assassino e ladrão de túmulos de Wisconsin foi descoberto após o desaparecimento de Bernice Worden, levando a polícia a encontrar uma casa repleta de restos humanos usados para fabricar objetos . Mas, apesar da brutalidade, a série opta por omitir certos detalhes, tanto por escolha narrativa quanto por limites éticos.

A obsessão real por exumar corpos
Na série, Gein é retratado como um assassino obcecado pela figura materna, algo que corresponde parcialmente à realidade. No entanto, o que a produção evita mostrar é a dimensão real de sua necrofilia.
Registros oficiais indicam que Gein exumou mais de dez corpos de mulheres que lembravam sua mãe, usando partes dos cadáveres para confeccionar máscaras, roupas e móveis.
Essa prática foi um dos principais elementos que inspiraram O Massacre da Serra Elétrica e Psicose, mas em Monstro, a ênfase recai sobre o drama psicológico, não o horror físico.

A figura da mãe foi suavizada
Augusta Gein, mãe do criminoso, é apresentada na série como uma mulher autoritária e profundamente religiosa, mas a realidade era ainda mais extrema. Relatos históricos descrevem Augusta como fanática, pregando diariamente que todas as mulheres eram pecadoras.
Essa visão distorcida moldou completamente a mente do filho, levando-o a associar pureza e pecado de forma doentia. Ryan Murphy opta por explorar essa relação de maneira simbólica, evitando reproduzir o fanatismo e o abuso psicológico em sua forma mais direta.

O número real de vítimas nunca foi confirmado
Na narrativa da Netflix, Gein aparece como o responsável direto por dois assassinatos confirmados, os de Bernice Worden e Mary Hogan. No entanto, a investigação da época sugeria que ele poderia ter feito muito mais vítimas.
Os restos encontrados em sua casa incluíam dezenas de ossos e fragmentos humanos que nunca foram identificados. Por falta de provas concretas, o número real de mortes segue sendo um mistério e a série opta por não especular.

O julgamento foi um espetáculo
Outro ponto ausente na produção é o impacto do julgamento de Gein na sociedade americana. Em 1958, o caso atraiu uma atenção midiática sem precedentes, transformando o assassino em uma figura quase mítica.
O tribunal precisou reforçar a segurança após ameaças e tentativas de invasão por curiosos e jornalistas. A cobertura foi tão intensa que o nome de Gein se tornou sinônimo de horror.

O legado no cinema de terror
A série mostra como Gein inspirou grandes diretores, mas não aprofunda o tamanho de sua influência. Sem ele, Psicose não teria nascido, nem O Massacre da Serra Elétrica ou O Silêncio dos Inocentes. Norman Bates, Leatherface e Buffalo Bill são ecos de uma mesma figura real.
A diferença é que Hollywood transformou o horror em arte, enquanto a história verdadeira era pura tragédia. Ao deixar de fora essa reflexão direta, Murphy escolhe priorizar a estética e o comentário social, deixando o peso histórico em segundo plano.

A linha entre fato e ficção
Monstro: A História de Ed Gein equilibra documentário e dramatização, mas nem sempre esclarece o que é real. O fazendeiro de Wisconsin não teve romances, não conheceu figuras do cinema e nunca foi retratado como alguém atraente ou complexo.
Essas liberdades criativas ajudam a construir a tensão dramática, mas afastam a série do retrato cru e repulsivo dos registros policiais. No fim, o verdadeiro Ed Gein permanece mais assustador do que qualquer versão que o entretenimento possa criar.