Quando uma obra literária é adaptada para as telas, por vezes, a narrativa transforma completamente a essência da obra original. No caso de Stephen King, isso acontece com frequência. O escritor é um dos autores mais adaptados da história, e cada uma de suas histórias passa por um processo de reinvenção. Com O Macaco, não foi diferente.
Baseado no conto homônimo publicado em 1980 e posteriormente revisado para a coletânea Tripulação de Esqueletos, o novo filme dirigido por Oz Perkins toma liberdades criativas que o afastam bastante da obra original. O tom da história, o design do brinquedo amaldiçoado e até mesmo a dinâmica dos personagens foram modificados para criar uma experiência mais exagerada e, acima de tudo, cômica.
Para os fãs mais puristas de King, isso poderia ser um problema. No entanto, a própria aceitação do autor em relação às mudanças indica que a nova versão tem seu mérito.
Mudanças no design do macaco
Um dos primeiros elementos a chamar atenção no filme é a mudança no design do macaco. No conto original, o brinquedo era um clássico macaco de pratos. Já na nova adaptação, o brinquedo tem um tambor e duas baquetas. A razão para essa mudança é um detalhe curioso, pois a versão original do brinquedo foi registrada pela Disney em Toy Story 3, impossibilitando seu uso no filme.
Mesmo sendo uma modificação forçada, ela acabou funcionando bem para a narrativa. Oz Perkins revelou em entrevistas que gostou da alteração, pois permitiu diferenciar seu filme de outras histórias. O efeito sonoro do tambor contribui para o suspense e dá um ritmo diferente à tensão, criando uma identidade própria para a nova versão.
Além da mudança estética, a adaptação também altera drasticamente o tom da história. Enquanto o conto original era um terror psicológico, focado no trauma do protagonista Hal Shelburn, o filme abraça uma abordagem de horror cômico, com mortes absurdas e efeitos exagerados.
A comédia presente no filme lembra outras produções do gênero que misturam terror e comédia, como A Morte Te Dá Parabéns e Arraste-me Para o Inferno. Em uma das cenas, uma personagem tem a cabeça incendiada por um fogão defeituoso, corre em desespero pela casa, tropeça na escada e tem o rosto perfurado por um suporte de caixa de correio. Esse nível de exagero não existia na obra original de King, mas se encaixou bem na proposta do filme.
Expansão da história
O filme também adiciona personagens e modifica significativamente o enredo. No conto original, Hal Shelburn precisa lidar com o brinquedo amaldiçoado que assombrou sua infância e voltou a ameaçar sua família. Na adaptação, Hal ganha um irmão gêmeo, Bill, e a relação conturbada entre os dois se torna um dos pontos centrais da narrativa.
No longa, Hal e Bill encontram o macaco no armário do pai e percebem que ele pode prever mortes. Hal, cansado dos abusos do irmão, gira a chave do brinquedo esperando que Bill morra. No entanto, o macaco não escolhe suas vítimas, e a própria mãe dos garotos acaba sendo morta, resultando em um dos pontos mais tenebrosos do filme.
Apesar das alterações significativas, Stephen King não fez objeções ao roteiro. O autor tem um histórico de opiniões diversas sobre adaptações de sua obra, sendo um crítico ferrenho de algumas, como O Iluminado de Stanley Kubrick. Mas, no caso de O Macaco, ele não sentiu necessidade de interferir no processo criativo de Oz Perkins.
Isso não é surpreendente, já que o próprio King tem experiência com humor e exagero em sua carreira. Em algumas de suas histórias mais populares, como Christine e A Metade Negra, ele flerta com o absurdo e o grotesco, elementos que estão presentes na adaptação de O Macaco.
O Macaco pode não ser o que os fãs de King esperavam, mas, no fim das contas, a nova versão busca muito mais ser uma reinvenção criativa do que uma tradução fiel do conto original.
O Macaco está em cartaz nos cinemas.