
No universo das comédias românticas, a velha questão “coração ou razão?” sempre encontra formas de se reinventar. Em Amores Materialistas, filme dirigido por Celine Song, esse dilema ganha contornos modernos e inesperados. O longa começa leve, divertido, mas aos poucos revela suas camadas mais sérias, colocando a protagonista em colisão com suas próprias convicções.
O resultado é uma história que mistura romance e reflexão, deixando o espectador dividido, assim como Lucy. A personagem de Dakota Johnson é uma casamenteira de sucesso em Nova York, cercada por solteiros supostamente perfeitos, mas pessoalmente mergulhada em dúvidas.
No centro do conflito, um triângulo amoroso entre ela, o bem-sucedido Harry (Pedro Pascal) e o ator em dificuldades John (Chris Evans), seu ex-namorado que ainda desperta sentimentos não resolvidos.
A escolha de Lucy
Apesar da conexão que surge com Harry, Lucy percebe que os laços entre eles não são tão profundos quanto parecem. Harry representa o conforto, a segurança e a vida estável que ela aprendeu a admirar, inclusive pela trajetória de seus clientes e amigos.
Mas à medida que a história avança, fica claro que, por trás da imagem impecável de Harry, há uma tentativa desesperada de se encaixar em padrões idealizados, o que inclui até uma cirurgia de aumento de estatura.
Enquanto isso, a presença de John reaparece como uma lembrança do que Lucy deixou para trás. Ele não tem a mesma estabilidade financeira ou o glamour de Harry, mas carrega uma sinceridade emocional que a abala.
O reencontro é marcado por conversas, memórias e pequenos gestos que reacendem algo mais genuíno, fugindo dos randes atos clichês. É nesse processo que Lucy compreende que o amor não pode ser projetado como uma equação perfeita, ele simplesmente acontece.
O reencontro com Sofia e a virada emocional
Outro ponto crucial do filme é o arco de Sofia, uma cliente que representa os riscos do mundo dos encontros modernos. Sua experiência traumática com um homem que ela conhece por meio da agência abala profundamente Lucy, que passa a repensar sua abordagem profissional e pessoal.
A amizade entre as duas é testada, mas se reconstrói após um episódio decisivo em que Lucy deixa tudo para acudir Sofia, numa atitude que revela seu amadurecimento emocional.
Essa reconciliação não só restabelece a confiança entre elas, como também ajuda Lucy a repensar suas escolhas. Ao ver Sofia aceitar uma nova chance no amor, ela se permite fazer o mesmo, mas de uma forma mais honesta consigo mesma.
Harry e a aceitação de um outro caminho
Diferente de outros triângulos amorosos do cinema, Amores Materialistas não demoniza nenhum dos lados. Harry é um personagem empático e carismático, cuja dor ao ser rejeitado é sentida com força.
Ele nunca deixa de tratar Lucy com respeito, mesmo diante da frustração de não ser escolhido. A pista final de que ele pode ter encontrado um novo romance reforça a ideia de que nem todos os finais felizes precisam ser centrados na protagonista.
A sutileza do roteiro dá a Harry um encerramento digno, sem punições ou exageros. Ele segue em frente, com a promessa de um futuro possível, mostrando que o amor também pode surgir onde menos se espera, desde que se esteja disposto a abrir espaço para ele.
O casamento da caverna e a mensagem do filme
Do começo ao fim, o longa brinca com uma metáfora visual que resgata uma cerimônia pré-histórica: um “casamento da caverna” entre dois personagens que trocam flores e ferramentas.
Essa imagem, reapresentada no encerramento, ganha novo sentido ao ser reinterpretada por Lucy em seu monólogo final. Ela entende que, por mais que as relações pareçam transações, o que sustenta qualquer união verdadeira é o afeto.
Quando John a pede em casamento com uma flor, numa repetição simbólica da cena da caverna, fica evidente que Lucy finalmente se libertou da ideia de perfeição. O gesto simples carrega mais valor do que qualquer anel de diamante.
O amor como única certeza
Amores Materialistas termina com a celebração de um sentimento que não cabe em fórmulas ou planilhas. Lucy escolhe John não porque ele seja o parceiro ideal aos olhos dos outros, mas porque é com ele que ela enxerga um futuro possível.
A partir da convivência, da escuta e da vulnerabilidade, ela redescobre o que significa amar e ser amada de volta. A decisão não é uma negação da lógica ou do bom senso, mas a aceitação de que o verdadeiro amor exige coragem.
Assim, o filme deixa clara a mensagem de que não se trata de encontrar o par perfeito, e sim de reconhecer quem, apesar das imperfeições, nos faz sentir em casa.
Amores Materialistas está em cartas nos cinemas.