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Crítica de Pluribus: Vince Gilligan entrega um clássico instantâneo da ficção científica

Série marca o retorno do criador de Breaking Bad à TV com um drama sci-fi sobre consciência coletiva e moralidade

Crítica de Pluribus: Vince Gilligan entrega um clássico instantâneo da ficção científica

Com Pluribus, Vince Gilligan retorna à TV após encerrar seu império criminal com Breaking BadBetter Call Saul e revisita o gênero que o revelou em Arquivo X. A nova série da Apple TV é uma mistura de ficção científica, filosofia e drama moral, ambientada em um futuro próximo onde a humanidade decide literalmente compartilhar a mente.

O título vem da expressão latina E pluribus unum (“De muitos, um”) e resume o conceito central: um experimento que conecta consciências humanas, dissolvendo as fronteiras entre indivíduo e coletivo. O que começa como uma utopia de empatia logo se transforma em um colapso de identidade, onde todos sentem, sofrem e pensam juntos, e ninguém é mais dono de si mesmo.

O peso da culpa e da empatia

A protagonista, vivida por Rhea Seehorn, é uma neurocientista que acredita estar criando a solução para os males da sociedade moderna. No entanto, conforme o projeto avança, ela percebe que a tecnologia não apenas une mentes, mas também espalha traumas, segredos e impulsos destrutivos.

Gilligan constrói sua narrativa em torno da culpa e da responsabilidade – temas recorrentes em sua filmografia -, mas agora sob uma lente mais existencial. O que acontece quando a empatia deixa de ser escolha e passa a ser obrigação? A resposta, como o próprio criador sugere, está longe de ser reconfortante.

A estética do desconforto

Visualmente, Pluribus é impecável. A direção de fotografia aposta em paletas metálicas e ambientes estéreis, evocando uma sensação de frieza tecnológica e isolamento emocional. A trilha sonora é minimalista, feita de ruídos sutis e sons sintéticos que lembram batimentos cardíacos, uma metáfora para a fusão entre corpo e máquina.

Cada episódio é construído com o ritmo deliberado que marca a assinatura de Gilligan: a tensão cresce devagar, sustentada por silêncios, olhares e pequenos gestos. Quando a ação explode, o impacto é inevitável.

Filosofia, suspense e humanidade

A série mergulha em discussões profundas sobre livre-arbítrio, ética e o valor da individualidade. Em certos momentos, Pluribus parece mais um ensaio audiovisual do que uma narrativa convencional, o que pode afastar parte do público. Ainda assim, a densidade das ideias é compensada por um roteiro que nunca abandona a emoção humana.

Há passagens de pura tensão psicológica, especialmente quando os personagens começam a perder o controle sobre seus próprios pensamentos. A atuação de Rhea Seehorn é hipnótica – contida, vulnerável e poderosa – enquanto participações de coadjuvantes reforçam o peso dramático da história.

Um final que ecoa

Sem entregar respostas fáceis, Pluribus termina de forma agridoce, mais interessada em provocar do que em explicar. Gilligan reafirma sua habilidade de criar finais abertos que convidam à reflexão, encerrando a série com a sensação de que a humanidade talvez não esteja pronta para o tipo de conexão que tanto deseja.

É uma ficção científica sem explosões, mas cheia de ideias. Um estudo sobre o que significa existir como parte de um todo – e o terror de se perder nesse processo.

Veredito

Pluribus é uma obra densa, elegante e profundamente emocional. Vince Gilligan entrega um sci-fi autoral, mais interessado em mente e moral do que em máquinas. Um retorno brilhante e inquietante, que transforma o conceito de “consciência coletiva” em uma metáfora sobre solidão, culpa e esperança.

Nota: ★★★★★ 4,5/5