Cannes 2024

Brasileira estreia como diretora em Cannes com documentário sobre resistência Yanomami

Eryk Rocha, Bruce Albert, Davi Kopenawa e Gabriela Carneiro da Cunha na premiére de "A Queda do Céu" em Cannes.
Eryk Rocha, Bruce Albert, Davi Kopenawa e Gabriela Carneiro da Cunha na premiére de "A Queda do Céu" em Cannes. | AFP

A cineasta e atriz Gabriela Carneiro da Cunha marcou sua estreia esse ano como diretora no Festival de Cannes com o documentário A Queda do Céu, uma obra que mergulha na cosmologia e na luta do povo Yanomami pela preservação de seu território e cultura. O filme, co-dirigido com Eryk Rocha, foi exibido na Quinzena dos Cineastas, mostra paralela do evento francês, e surge como um alerta sobre a crise climática e a exploração da Amazônia 27.

Da literatura à tela: uma jornada de sete anos

A inspiração veio do livro homônimo escrito pelo líder Yanomami Davi Kopenawa e pelo antropólogo francês Bruce Albert, que Gabriela descobriu em 2017 durante pesquisas na Amazônia. “Ele mudou minha forma de enxergar a sociedade branca. Davi faz uma ‘contra-antropologia’, usando a perspectiva xamânica para nos questionar”, explicou a diretora, que dedicou uma década a projetos ligados aos rios amazônicos antes do filme 210.

A produção, desenvolvida ao longo de sete anos, envolveu uma colaboração íntima com comunidades Yanomami. A equipe não apenas registrou o cotidiano indígena, mas também capacitou comunicadores locais com equipamentos e oficinas, resultando em coautoria de curtas como Mãri hi – A Árvore do Sonho (2023), premiado no festival É Tudo Verdade 27.

O ritual que se tornou o coração do filme

O ponto central do documentário é o Reahu, cerimônia fúnebre que dura semanas e homenageia o sogro de Davi Kopenawa. “Fomos convidados a registrar esse ritual, que se tornou a alma da narrativa”, destacou Gabriela. A filmagem, realizada com uma equipe enxuta de cinco pessoas, priorizou a imersão cultural, evitando interferências coloniais. “Deixamo-nos levar pela força e pelos sonhos da comunidade”, acrescentou Eryk Rocha 249.

A escolha de não usar luzes artificiais durante as cenas noturnas reforçou a autenticidade do projeto. “A penumbra tornou-se uma linguagem própria, assim como os cantos indígenas que guiam a narrativa”, explicou o diretor de fotografia Bernard Machado 1.

Um alerta para o mundo

Além de celebrar a cultura Yanomami, o filme denuncia ameaças como garimpo ilegal, desmatamento e contaminação por mercúrio — problemas que afetam diretamente mulheres indígenas, tema de outro projeto de Gabriela com os Tapajós. “São lutas pelo território, pelos filhos e pelo útero das comunidades”, ressaltou a diretora, que recebeu o Prêmio L’Oréal Lights on Women’s Worth em Cannes, iniciativa que apoia lideranças femininas no cinema 210.

Legado e esperança

Para Davi Kopenawa, a obra é um instrumento de diálogo com o “povo da mercadoria”. “Espero que promova respeito à integridade dos povos originários”, declarou seu filho, Dário Kopenawa, presente no festival. A mensagem central ecoa a cosmologia Yanomami: sem xamãs para sustentar o céu, a Terra entrará em colapso. “É uma vingança do mundo”, alerta Davi no filme 17.

A Queda do Céu chega ao Brasil ainda em 2024, reforçando a urgência de ouvir vozes indígenas em um planeta à beira do colapso climático.

Ficha Técnica

Título Original: A Queda do Céu

Direção: Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha

Roteiro: Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha

Produção: Eryk Rocha, Gabriela Carneiro da Cunha, Donatella Palermo, Richard Copans, Heloisa Jinzenji e Tárik Puggina

Produtoras: Aruac Filmes, Hutukara Associação Yanomami, Les Films d’Ici

Fotografia: Eryk Rocha, Bernard Machado, Morzaniel Ɨramari e Roseane Yariana

Montagem: Renato Vallone, Lorena Duarte e Pedro Geraldo

Som: Marcos Lopes, Guile Martins (desenho de som) e Toco Cerqueira (mixagem)

Trilha Sonora Original: Comunidade de Watorikɨ e convidados

Elenco: Davi Kopenawa, Justino Yanomami, Givaldo Yanomami, Raimundo Yanomami, Dinarte Yanomami, Guiomar Kopenawa, Roseane Yariana e a comunidade de Watorikɨ

Duração: 110 minutos

Gênero: Documentário

País de Origem: Brasil, Itália, França

Ano de Lançamento: 2024

Idioma: Português e Yanomami

Classificação Indicativa: 14 anos

Sinopse:

O documentário é baseado no poderoso testemunho do xamã e líder Yanomami Davi Kopenawa e acompanha o importante ritual Reahu, que mobiliza a comunidade de Watorikɨ em um esforço coletivo para “segurar o céu”. O filme faz uma crítica xamânica àqueles chamados por Davi de “povo da mercadoria”, abordando temas como o garimpo ilegal e as epidemias trazidas por forasteiros, destacando a beleza da cosmologia Yanomami e a força geopolítica de seus espíritos xapiri.

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